Contrato de aluguel é válido mesmo que apenas um dos coproprietários tenha locado o imóvel
Ainda que o Código Civil exija a anuência da maioria absoluta dos coproprietários para dar posse de imóvel a terceiros, eventual inexistência desse consentimento não gera a nulidade do contrato de locação, tornando-o incapaz de produzir efeitos jurídicos. Os vícios que podem levar à anulação do contrato são aqueles previstos nos artigos 166 e 167 do Código Civil, e a legislação não impõe a obrigatoriedade da presença de todos os proprietários no instrumento locatício.
O entendimento foi fixado pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao manter acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) que declarou a rescisão de contrato de aluguel e determinou o despejo do locatário – o qual firmou o contrato com apenas um dos proprietários do imóvel.
O autor da ação de despejo – que posteriormente faleceu e foi sucedido pelos herdeiros – entrou com o pedido em nome próprio e como representante legal dos demais proprietários. Entretanto, duas das coproprietárias alegaram que não fizeram parte do contrato de locação nem autorizaram a sua celebração.
Em primeiro grau, o juiz acolheu a tese das coproprietárias e declarou a nulidade do contrato, julgando improcedente a ação. Entretanto, o TJSP reformou a sentença por entender que a falta de concordância dos coproprietários não gera nulidade.
Ausência de vícios
Relator do recurso das coproprietárias, o ministro Villas Bôas Cueva explicou que, nos termos do artigo 1.314 do Código Civil, admite-se que qualquer um dos condôminos reivindique a coisa de terceiro e defenda a sua posse. No entanto, ponderou, para que seja alterada a destinação do bem, ou para dar a posse a alguém, é necessário o consenso dos condôminos.
Por outro lado, no caso dos autos, o ministro apontou que não foi demonstrada a ocorrência de nenhum dos vícios capazes de gerar a nulidade do negócio jurídico, como aqueles descritos no Código Civil. “Ademais, é incontroverso nos autos que o contrato foi celebrado entre pessoas capazes e houve a transmissão da posse do imóvel para o réu”, afirmou.
“A respeito da capacidade do autor para firmar contrato de locação, oportuno observar que a lei nem sequer exige a condição de proprietário para sua celebração”, complementou o ministro.
Situação inusitada
Por esses motivos, Villas Bôas Cueva entendeu que não poderia ser acolhida a tese de nulidade do contrato, de modo a exonerar o locatário de qualquer obrigação, especialmente em virtude do princípio da vedação do enriquecimento sem causa, previsto no artigo 884 do Código Civil.
Ao manter o acórdão do TJSP, o relator também considerou “inusitado” que a tese de nulidade do contrato de locação tenha sido levantada pelas coproprietárias, pois elas, em tese, teriam interesse no recebimento dos aluguéis.
“Conforme concluiu o tribunal de origem, mostra-se irrelevante, no presente caso, a demonstração de consentimento dos coproprietários para que o autor firmasse o contrato de locação, sendo devidos os aluguéis vencidos e inadimplidos até a desocupação do imóvel”, finalizou o ministro.
Em controvérsia sobre venda de imóvel, registro de escritura prevalece sobre contrato particular
A 4ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo manteve decisão que, em caso de controvérsia sobre dois negócios de compra e venda do mesmo imóvel, reconheceu como válido aquele que teve escritura pública registrada.
O autor alegou que comprou um imóvel, por meio de contrato particular – pagando a quantia de R$ 180 mil –, mas não fez o registro em cartório. Posteriormente, o primeiro dono teria realizado nova negociação com um terceiro, que pagou R$ 250 mil e registrou o título. O autor argumentou que a essa venda seria uma fraude, mera simulação para retirar sua propriedade. Na ação, pedia a anulação da segunda negociação e outorga de escritura definitiva em seu nome. O pedido foi negado em 1º grau, remanescendo somente o direito de o autor buscar eventual ressarcimento de perdas e danos contra o vendedor, em ação própria.
O desembargador Enio Zuliani, relator da apelação, destacou em seu voto que o negócio celebrado entre as partes não transmite a propriedade, embora represente vínculo entre os contratantes. Segundo ele, o que transmite o direito real da propriedade é o registro do título no cartório de registro de imóveis. “No caso de duas vendas do mesmo imóvel – como ocorrido no presente caso – considera-se titular do domínio ou proprietário aquele que realizou o registro em primeiro lugar, mesmo que o negócio que realizou tenha sido posterior ao primeiro”, afirmou.
Segundo o magistrado a fraude não foi comprovada, já que o fato de o comprador e vendedor serem amigos não é suficiente para caracterizar um negócio simulado. “É preciso, na disputa de duas compras e vendas comprometidas por sérias e graves acusações de desvirtuamentos ideológicos, priorizar aquela que seria menos repugnante ao ideal de justiça. Então e diante das incongruências que afetam muito mais a credibilidade do contrato particular, está correta a sentença que outorga primazia a escritura e seu registro. Afinal, presume-se a prova do pagamento do preço, porque foi referido em documento público, sem que se demonstrasse, com substratos probatórios concretos, a má-fé do terceiro adquirente”, concluiu o relator.
O julgamento, decidido por maioria de votos, teve a participação dos desembargadores Alcides Leopoldo, Marcia Dallla Déa Barone, Maurício Campos da Silva Velho, Fábio Quadros e Natan Zelinschi de Arruda.
Apelação nº 1004011-96.2019.8.26.0161
Na vigência do CPC de 1973, dívidas condominiais não se sub-rogam no valor da arrematação de imóvel
A previsão de que as dívidas caracterizadas como propter rem, como as despesas condominiais, são sub-rogadas no valor da arrematação de imóvel – como determina o Código de Processo Civil de 2015 – não é aplicável à alienação judicial praticada sob a vigência do CPC de 1973.
Com esse entendimento, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou recurso especial de uma arrematante de imóvel vendido em leilão público, em 2015, que pedia para não ser responsabilizada por dívidas condominiais vencidas anteriormente à arrematação.
Segundo o processo, o condomínio do imóvel arrematado por ela ajuizou uma ação de cobrança das despesas vencidas entre abril de 2010 e janeiro de 2013. O pedido foi julgado procedente para condená-la ao pagamento das dívidas, sob o fundamento de que a arrematante adquiriu o bem ciente da dívida, conforme informações do edital do leilão. A decisão foi mantida pelo Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR).
Ao STJ, a arrematante alegou que a dívida condominial deve ser quitada com o produto da arrematação, de acordo com o artigo 908, parágrafo 1º, do CPC de 2015. Além disso, ela afirmou que o edital não informou o valor expresso do débito condominial, de modo que ela seria parte ilegítima para responder pelas dívidas pretéritas.
Concurso de credores
A relatora do recurso, ministra Nancy Andrighi, explicou que, na hipótese, a arrematação ocorreu sob a vigência do CPC de 1973, razão pela qual a pretensão de aplicação da previsão do CPC de 2015 e seus efeitos acarretaria indevida retroatividade da lei processual nova.
A ministra destacou que, nos casos de expropriação de bens do devedor para execução de dívida, o juiz só autoriza o credor a levantar a quantia se, nos termos do artigo 709 do CPC de 1973, a execução tiver corrido a exclusivo benefício do exequente e não houver privilégio ou preferência de terceiros sobre os bens penhorados, anterior à penhora do exequente; ou se o credor não tiver sido declarado insolvente.
Segundo a relatora, pode ser instaurado o concurso singular de credores ou concurso particular de preferências, como incidente processual da fase de pagamento, caso exista conflito entre preferências dos credores sobre o produto da alienação e não ocorrer a insolvência do devedor.
Títulos extrajudiciais
“Com efeito, na vigência do CPC de 1973, o concurso singular de credores sobre o produto da alienação forçada de bens deveria ser instaurado na hipótese de coexistência de privilégios sobre o bem – como hipoteca, penhor ou penhora –, os quais deveriam ter sido adquiridos antes da penhora da qual resultou a expropriação forçada”, disse.
Para tanto, a ministra lembrou que era indispensável – mesmo que se tratasse de dívida com garantia real – que o credor estranho à execução na qual foi realizada a alienação judicial detivesse título executivo constituído previamente à penhora realizada.
De acordo com a relatora, essa circunstância foi mantida no atual código; agora, contudo, a legislação prevê que as despesas condominiais são, caso sejam documentalmente comprovadas, títulos executivos extrajudiciais, de acordo com o artigo 784, VIII, do CPC/15.
“É essa a previsão que permite que, no diploma agora vigente, por força do artigo 908, parágrafo 1º, do CPC/2015, os créditos propter rem, como as despesas condominiais, acaso documentalmente comprovadas – configurado, portanto, o título executivo extrajudicial – se sub-roguem, de imediato, no preço da adjudicação ou da alienação”, afirmou.
Ciência da dívida
No que diz respeito às cotas condominiais vencidas antes da alienação forçada, a ministra observou que o arrematante é por elas responsável se o edital contiver informações sobre a pendência dessas despesas.
Segundo a ministra, no caso dos autos, o TJPR ressaltou que é inequívoca a ciência da arrematante sobre a existência de despesas condominiais em relação ao imóvel adquirido, tanto que constou expressamente do auto de arrematação, havendo ainda o ciente de sua procuradora no cálculo da dívida.
Condomínio, empresa de segurança e vizinho indenizarão casal que teve apartamento furtado
A 30ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo condenou condomínio, empresa de segurança e morador a indenizarem, por danos morais e materiais, casal que teve o apartamento arrombado e furtado. As reparações foram fixadas em R$ 40 mil, pelos danos morais, e R$ 3.245 pelos danos materiais.
De acordo com os autos, ao retornarem a sua residência, os autores notaram que o apartamento havia sido arrombado e diversos bens, como aparelhos eletrônicos, relógios, joias, dinheiro e outros, subtraídos. Ao analisarem as imagens das câmeras de segurança, verificaram que os assaltantes entraram no condomínio com a permissão de um morador, que realizava festa. Os “convidados”, ao perceberem que o apartamento estava vazio, aproveitaram a oportunidade para arrombar a porta.
“Não há como afastar a responsabilização dos corréus pela ocorrência do evento danoso. Isto porque restaram evidentes as várias falhas que contribuíram para que o furto da unidade condominial ocorresse. Uma delas é a permissão de pessoas não autorizadas a entrar na festa, ainda que tenham sido autorizadas pelo morador, que estava realizando a festa. A entrada poderia ser permitida desde que anotados nomes, verificados documentos entre outras medidas de segurança”, escreveu a relatora da apelação, desembargadora Maria Lúcia Pizzotti. Para a magistrada, os funcionários do condomínio deveriam fiscalizar o evento e comunicar aos seguranças da empresa alguma atitude suspeita, como, por exemplo, os “supostos convidados” que ficaram a maior parte do tempo fora do salão de festas observando os apartamentos. “Observa-se que houve negligência dos referidos e da equipe de vigilância das câmeras, porque não estavam atentos ao que ocorria”, finalizou.
O julgamento, de votação unânime, teve a participação dos desembargadores Lino Machado e Carlos Russo.
Apelação Cível nº 1127309-51.2018.8.26.0100
Tribunal mantém nulidade de assembleia que elegeu síndico durante pandemia
A 31ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo manteve sentença que negou reconhecimento de ata de eleição de síndico, realizada em um condomínio da Capital em maio deste ano, no auge da pandemia.
A empresa administradora do condomínio não reconheceu a legalidade da assembleia, pois esta se deu durante o período de isolamento social, o que impossibilitou a participação da maioria dos moradores – das 160 unidades, apenas 25 condôminos compareceram. O sindico eleito procurou a Justiça para tentar o reconhecimento da eleição
Para o relator do recurso, desembargador Adilson de Araújo, “ainda que tenha sido atingido eventual quórum para deliberação das matérias constantes do edital, não é possível desconsiderar evento excepcional pelo qual passa toda sociedade brasileira e com mais intensidade os moradores da cidade de São Paulo”. Segundo ele, ”o certo é que vários moradores foram impedidos de comparecer ao ato e externar sua vontade, pois optaram em preservar a própria vida, bem como de familiares”.
Adilson Araújo ressaltou, ainda, que “a reunião foi realizada na garagem do primeiro subsolo do próprio condomínio, ou seja, local totalmente inapropriado por estar a cidade enfrentando crise pandêmica”.
Participaram do julgamento, que teve votação unânime, os desembargadores Francisco Casconi e Paulo Ayrosa.
Apelação nº 1042765-62.2020.8.26.0100
Restabelecida decisão que considerou abusiva devolução da comissão de corretagem em rescisão contratual
A Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em ação rescisória, restabeleceu a eficácia de decisão que considerou abusiva a cláusula contratual que exigia da corretora a devolução da comissão de corretagem na hipótese de rescisão da venda do imóvel.
A ação rescisória foi proposta por uma corretora para rescindir acórdão proferido pela Quarta Turma do STJ, segundo o qual, não havendo a conclusão da venda do imóvel por desistência das partes, é indevido o pagamento da comissão de corretagem.
Por maioria, ao acompanhar o voto do ministro Marco Buzzi, a Segunda Seção julgou a rescisória procedente, enfatizando a distinção entre desistência – antes da celebração do contrato – e rescisão por inadimplemento contratual.
Efetiva intermediação
Segundo os autos, a corretora foi contratada por uma construtora para intermediar a venda de imóveis residenciais. Porém, segundo a corretora, não houve o pagamento pela concretização dos negócios, o que a levou a entrar na Justiça. A construtora foi condenada a pagar mais de R$ 500 mil a título de comissão de corretagem.
O juiz concluiu que houve a efetiva intermediação dos negócios, ainda que posteriormente rescindidos por falta de pagamento das prestações. A decisão, mantida em segunda instância, foi reformada no STJ.
Na ação rescisória, a corretora sustentou que o acórdão da Quarta Turma, ao entender não ter sido concluída a venda das unidades, incorreu em erro de fato, visto que a concretização dos contratos não era ponto controvertido.
Para a corretora, não houve as apontadas desistências, mas sim a rescisão de contratos em razão da falta de pagamento por parte dos compradores.
Outros contornos
Em seu voto, o ministro Marco Buzzi afirmou que a discussão do processo recebeu “outros contornos” quando do julgamento do recurso especial pela Quarta Turma.
Segundo ele, nas demandas em que construtoras e corretores discutem se é ou não devida a comissão de corretagem, é comum haver controvérsia sobre os contornos fáticos da negociação, na qual se analisam as circunstâncias relativas à intermediação imobiliária – em especial, se essa atividade viabilizou a formação de consenso entre as partes quanto aos elementos essenciais do negócio de compra e venda.
Porém, Marco Buzzi declarou que a controvérsia, no caso analisado, não se estabeleceu em relação ao cumprimento dos objetivos da corretagem, mas sim em torno da validade da cláusula contratual que afastava o direito da corretora às comissões na hipótese de rescisão do contrato por ela viabilizado inicialmente.
“A discussão travada na origem da demanda subjacente se deu, a rigor, sobre a possibilidade de o contrato de corretagem, firmado sob a égide do Código Civil de 1916, estabelecer como motivo para o não pagamento ou a determinação de devolução das comissões eventual rescisão ocorrida, por óbvio, após ultimada a celebração da compra e venda e, acrescente-se, absolutamente alheia a qualquer conduta da corretora”, explicou.
Erro de fato
Como lembrou o ministro, as instâncias ordinárias concluíram que eventual distrato não prejudicaria o pagamento da comissão de corretagem, pois a intermediação já teria alcançado sua finalidade. “Não há que se falar – porque, de fato, nada se disse na sentença e no acórdão – a respeito de suposta desistência na compra dos apartamentos”, assinalou.
De acordo com Marco Buzzi, ao entender que a venda dos imóveis não foi concluída, a Quarta Turma incorreu em erro de fato, visto que não houve desistência dos contratos antes da celebração, mas rescisão por inadimplemento contratual.
“É incontroverso nos autos originários que a concretização dos negócios fora, sim, perfectibilizada, tendo sido considerada existente, apenas nesta instância superior, uma circunstância fática efetivamente não ocorrida, o que viabiliza a rescisão do julgado” – concluiu o ministro.
Usucapião urbano também se aplica a apartamentos
O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que o instituto do usucapião urbano, previsto na Constituição Federal (artigo 183), também se aplica a apartamentos em condomínios residenciais, e não apenas a lotes urbanos. A decisão foi proferida no Recurso Extraordinário (RE) 305416, julgado na sessão virtual encerrada em 28/08.
A ação originária foi movida pela moradora de um apartamento em Porto Alegre (RS) financiado por seu ex-marido junto ao Bradesco, a fim de impedir a venda do imóvel para quitar as prestações inadimplentes e buscar o reconhecimento da propriedade, com a alegação de que residia no imóvel por mais de 15 anos. O Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul (TJ-RS) manteve a decisão de primeira instância que havia extinguido a ação sem julgamento do mérito. De acordo com o TJ-RS, o pedido seria juridicamente impossível, pois a regra constitucional que instituiu o usucapião se destina somente a lotes, e não a unidades de um edifício.
No STF, o julgamento começou em maio de 2016, mas foi suspenso por pedido de vista do ministro Ayres Britto (aposentado). Seu sucessor, o ministro Luís Roberto Barroso, se declarou suspeito e devolveu os autos ao relator, ministro Marco Aurélio, para continuidade de julgamento.
Imóvel para moradia
Em seu voto, o relator observou que, de acordo com a Constituição, é própria para usucapião a área urbana de até 250m² utilizada para moradia individual ou da família. Segundo o ministro, a regra exige apenas que o interessado esteja utilizando o imóvel de como moradia há pelo menos cinco anos e que não tenha outro bem imóvel (urbano ou rural) nem tenha sido beneficiado pelo usucapião anteriormente. Ele ressaltou que a norma constitucional não distingue a espécie de imóvel – se individual propriamente dito ou se situado em condomínio horizontal. “Os requisitos constitucionais estão direcionados a viabilizar a manutenção da moradia”, afirmou.
Ainda de acordo com o relator, o Estatuto da Cidade (Lei 10.257/2001) não afasta a possibilidade de que o imóvel seja uma unidade condominial, e o Código Civil também não impõe restrição ao instituto (artigo 1.240), exigindo para a aquisição do domínio apenas a metragem máxima e o uso para moradia. O ministro lembrou que o Código Civil também estabelece que, no instrumento de instituição do condomínio, caberá a cada unidade imobiliária uma fração ideal no solo e nas partes comuns e, por este motivo, não há dúvida de que o apartamento que compõe a unidade e também a fração do terreno são individualizados.
Por unanimidade, foi dado provimento ao recurso para determinar que o TJ-RS julgue o mérito da ação.
Os efeitos da pandemia no universo dos contratos
A pandemia global do COVID-19 (Coronavírus) provoca toda a sorte de disrupção, na medida em que ondas concêntricas de inexecução contratual forem se espraiando pelas várias e incontáveis cadeias de relacionamento humano, comercial ou empresarial.
Sob o império do direito, e este é o nosso foco de observação, a submissão das partes à avença (pacta sunt servanda = os pactos devem ser cumpridos) está agora sob a incidência de seu contraponto prático e acadêmico (rebus sic stantibus = estando assim as coisas).
O artigo 393 do Código Civil brasileiro cuida das hipóteses de força maior e caso fortuito para informar que o devedor não responde pelos prejuízos (deles) resultantes, exceto “se expressamente não se houver por eles responsabilizado.”
De toda sorte, não será por falta de amparo legal que os vitimados pelos efeitos da pandemia estarão à míngua e sem proteção.
Seja um ou outro o motivo (legal e teleológico) para justificar o descumprimento de determinada obrigação, com o propósito imediato de escusar o devedor pela falta, exonerando-o de penalidades, multas e do dever de indenizar, encontramo-nos às portas de um período complexo e delicado de apuração, contabilização, alocação ou divisão de prejuízos (onde e como couber) – em sede de renegociações, ancoradas no princípio da boa-fé objetiva, em amplo espectro, a fim de (I) mitigar ou evitar perdas efetivas, (II) quando possível, preservar o vínculo jurídico-obrigacional, ou (III) cuidar de sua terminação, do modo menos traumático.
E, mais importante que tudo isso, desde agora e especialmente no pós-pandemia, já é tempo para se pensar no saneamento dos relacionamentos pessoais, comerciais e empresariais visando a reconstrução e/ou à consolidação de vínculos contratuais.
Por óbvio, à vista da inexistência de nexo causal bem demonstrado, não será possível, nem razoável, invocar a pandemia para se furtar ao cumprimento de obrigação. Ou seja, a incapacidade de adimplemento, dos pontos de vista subjetivo e objetivo, somente poderá ser alegada se a mesma for, ao menos indiretamente, decorrente dos efeitos do surto epidêmico do COVID-19.
Dada as ordens de grandeza, as dissensões e disputas porventura nascidas da inexecução das obrigações (na esteira dos parágrafos precedentes) poderão provocar uma crise no sistema judiciário brasileiro – senão crise aguda, uma piora importante na sobrecarregada e deficitária máquina de prestação jurisdicional.
Conciliação, mediação e arbitragem
Daí, a importância do uso de meios adequados para resolução de disputas, como a CONCILIAÇÃO, MEDIAÇÃO e a ARBITRAGEM – como alternativas ao emprego dos serviços estatais do Poder Judiciário.
E não apenas os procedimentos institucionais administrados pelas CÂMARAS PRIVADAS ou CENTROS DE ARBITRAGEM E MEDIAÇÃO, cada vez mais conhecidas e prestigiadas, mas também os AD HOC, em que as partes procuram diretamente profissionais neutros e imparciais, capacitados a proferirem uma DECISÃO ARBITRAL, célere, segura, precisa e isenta de infindáveis questionamentos ou a CRIAREM CONDIÇÕES PARA QUE AS PARTES SE RESOLVAM.
Esses procedimentos AD HOC podem ocorrer no recôndito de escritórios de advocacia, longe da burocracia dos tribunais, ou em quaisquer outros ambientes profissionais de mediação e arbitragem, desde que baseados na autonomia das vontades e manejados por profissionais hábeis e sensíveis aos temas atinentes à órbita dos contratos, conscientes da importância dos ganhos difluentes da composição racional – e extrajudicial – de conflitos.
Contratos
O momento é excepcional para a revisão de vínculos contratuais em geral, com outras recomendações específicas, dentre elas o armazenamento cuidadoso de documentos, dados, informações, correspondências em geral, a notificação e o aviso acerca da impossibilidade real e concreta de adimplir, para o fim de fazer prova de causa e efeito nas situações em que o direito se preste a tutelar.
Por fim, e não menos importante, novos contratos e transações empresariais (sim, a roda não para, mas apenas gira mais devagar) devem dispor sobre os efeitos do prolongamento da pandemia, no que toca a capacidade de entrega/execução de cada contratante, mitigação de perdas e da alocação de riscos, formas e modos de resolução de controvérsias.
Proposta cria renda permanente de R$ 600 para pessoas em situação de vulnerabilidade
Seriam unificados quatro programas: o de Erradicação do Trabalho Infantil, o Seguro Defeso, o Bolsa Família e o Bolsa Verde.
O Projeto de Lei 3023/20 cria o Programa Renda Básica Brasileira, destinado a ações de transferências pecuniárias da União. O objetivo é tornar permanente o auxílio de R$ 600 mensais criado para mitigar os efeitos da pandemia de coronavírus (Lei 13.982/20). O Congresso Nacional reconheceu o estado de calamidade pública devido à Covid-19.
Conforme o texto em tramitação na Câmara dos Deputados, serão unificados quatro programas, o de Erradicação do Trabalho Infantil (Lei 8.742/93), o Seguro Defeso (Lei 10.779/03), o Bolsa Família (Lei 10.836/04) e o Bolsa Verde (Lei 12.512/11). O valor do benefício mensal será corrigido conforme a variação da inflação anual (INPC).
“É a possibilidade de que o povo tenha condições de atender às suas necessidades básicas de sobrevivência quando não estiver empregado”, afirmou o autor da proposta, deputado Eduardo da Fonte (PP-PE). Conforme o projeto, os atuais beneficiários dos programas unificados serão automaticamente incorporados na nova ação governamental.
Regras gerais
Para ter direito ao benefício, será exigido do requerente: pelo menos 18 anos, salvo se mãe adolescente; não ser titular de outro benefício (previdenciário, assistencial, de transferência de renda ou seguro-desemprego); renda familiar mensal per capita de até 1/2 salário mínimo, ou mensal total de até três mínimos; e não ter recebido no ano anterior acima do limite de isenção do Imposto de Renda das Pessoas Físicas (IRPF).
A pessoa não poderá ter emprego formal (CLT, Decreto-Lei 5.452/43) ou vínculo como agente público. O texto prevê exceções nos casos de microempreendedor individual (MEI); contribuinte individual ou facultativo do Regime Geral de Previdência Social (Lei 8.212/91); trabalhador informal (empregado, autônomo ou desempregado, inclusive intermitente inativo) inscrito no CadÚnico; e pescador artesanal.
A quantidade de beneficiários da renda básica em uma mesma família será limitada a dois membros, e a mulher provedora de família monoparental receberá duas cotas (R$ 1.200). As condições de renda familiar mensal per capita e total serão verificadas por meio do Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal (CadÚnico) e por meio de autodeclaração em plataforma digital para os não inscritos.
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A proposta insere no Código Penal (Decreto-Lei 2.848/40) o crime de recebimento irregular de benefício de programa governamental, com pena de prisão (de 2 a 5 anos) e multa. Constatada a irregularidade, inclusive por meio dos órgãos de fiscalização e controle, o responsável ficará inabilitado por cinco anos para iniciativas governamentais.
Financiamento
O PL 3023/20 determina ainda diferentes fontes para o financiamento do Programa Renda Básica Brasileira. Aumenta a alíquota da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) das instituições financeiras de 20% para 25%. Estabelece também a cobrança de Imposto de Renda sobre lucros e dividendos, e eleva de 15% para 20% a alíquota desse mesmo tributo sobre juros do capital próprio.
O texto cria uma nova contribuição com a mudança da destinação do Fundo para o Desenvolvimento Tecnológico das Telecomunicações (Funttel), mantendo as atuais alíquotas – esse fundo setorial acumula atualmente quase R$ 2,1 bilhões em saldo retido no Tesouro Nacional. Além disso, prevê que o governo utilize no programa o superávit financeiro do Tesouro apurado em balanço dos exercícios anteriores.
“O Programa Renda Básica Brasileira será uma grande oportunidade de patrocinarmos um grande avanço social, propiciará as condições de fortalecer o mercado interno por meio do consumo das famílias e estimulará o progresso econômico”, disse Eduardo da Fonte. Outra proposta dele prorroga o auxílio de R$ 600 até dezembro (PL 2550/20).
Outras iniciativas
O auxílio emergencial de R$ 600 é a principal medida, em volume financeiro, para mitigar os efeitos econômicos da pandemia de coronavírus. Foram liberados R$ 152,6 bilhões. Quase 80 iniciativas parlamentares na Câmara dos Deputados buscam ampliar o rol de potenciais beneficiários ou estender o prazo dos pagamentos (hoje, três parcelas).
Eduardo da Fonte lembrou ainda que a Lei Suplicy (Lei 10.835/04) instituiu a renda básica de cidadania, mas “infelizmente nunca [foi] totalmente implantada”. Essa norma prevê que brasileiros residentes e estrangeiros há pelo menos cinco anos no País receberão do governo um benefício monetário anual, não importando a situação socioeconômica.
Projeto institui medidas para abrigar mulheres em situação de violência durante a pandemia
Texto dispensa boletim de ocorrência para acolhimento de mulheres em abrigos e prevê que hotéis e pousadas possam ser requisitados como abrigos temporários, mediante indenização do Poder Público.
O Projeto de Lei 1552/20 institui ações para o abrigamento de mulheres em situação de violência doméstica enquanto durarem as medidas de isolamento social para evitar a contaminação pelo novo coronavírus.
Em análise na Câmara dos Deputados, o texto é assinado pela deputada Sâmia Bomfim (Psol-SP) e mais 22 deputados de diferentes partidos. A coordenadora da bancada feminina, deputada Professora Dorinha Seabra Rezende (DEM-TO), pediu urgência para a matéria.
Pela proposta, os serviços de abrigamento serão considerados essenciais – ou seja, não poderão ser suspensos durante a pandemia de Covid-19.
O texto assegura às mulheres em situação de violência o acolhimento em abrigo sigiloso temporário por 15 dias, acompanhadas ou não de seus filhos, antes do encaminhamento para o abrigamento provisório final, quando este for necessário (casos de grave ameaça ou risco de morte). Caso não existam vagas em abrigos sigilosos, poderão ser requisitados pelo Poder Público pousadas e hotéis, mediante indenização posterior. O sigilo e segurança da mulher abrigada deverão ser resguardados nesses locais.
“A medida busca não somente atender às recomendações de contenção do Covid-19 como também não expor ao contágio mulheres e crianças que já seguem acolhidas nos locais de abrigamento, evitando assim a propagação do vírus no sistema”, afirmam os autores da proposta. O texto também garante o transporte da mulher para os locais de abrigo.
Dispensa de boletim
O projeto prevê que a inclusão de mulheres em situação de violência em programa de abrigamento poderá ocorrer a partir de requerimento a órgãos e instituições que compõem a rede de enfrentamento à violência contra mulheres, independentemente de registro de boletim de ocorrência (BO) ou deferimento de medida protetiva.
Em conjunto com esses órgãos, os municípios, por meio de suas secretarias de assistência social, deverão organizar o fluxo de atendimento e acolhimento das mulheres em situação de violência e a abertura de novos locais de abrigamento provisório e emergencial. Além disso, os municípios deverão disponibilizar um número telefônico para informações sobre vagas em locais de abrigamento emergencial, que deverá ser afixado em local visível em todo serviço público essencial em funcionamento.
…
Cada estado deverá manter cadastro atualizado dos locais de abrigamento existentes nos municípios e estabelecer articulação com os demais estados para encaminhar mulheres que necessitem de abrigo em localidade distante de sua região de origem.
“Dada a ausência de um sistema nacional que padronize ações e procedimentos nessa seara, a proposta estabelece ações articuladas entre as diversas esferas para a garantia de fluxo e facilitação de acesso aos serviços”, explicam os autores.
Despesas
Pela proposta, o Poder Público não reduzirá o efetivo de trabalhadores e servidores nos serviços do Sistema Único de Assistência Social (Suas), e assegurará, mesmo que temporariamente, a contratação de profissionais dedicados ao atendimento às mulheres em situação de violência, como psicólogas, assistentes sociais, advogadas e cuidadoras de crianças.
As despesas para garantir a aplicação da lei, se aprovada, ficarão por conta da União, por meio da abertura de créditos extraordinários aos estados e municípios.
Proposta já aprovada
A Câmara dos Deputados já aprovou outro projeto que evita interrupção de serviços de combate à violência doméstica (PL 129/20). Pela proposta, os órgãos de segurança deverão criar canais gratuitos de comunicação para atendimento virtual de situações que envolvam violência contra a mulher. O atendimento presencial será obrigatório para os casos mais graves.
Atualmente em análise no Senado, a proposta permite que a vítima solicite quaisquer medidas protetivas de urgência por meios dos dispositivos de comunicação de atendimento online.