Os efeitos da pandemia no universo dos contratos
A pandemia global do COVID-19 (Coronavírus) provoca toda a sorte de disrupção, na medida em que ondas concêntricas de inexecução contratual forem se espraiando pelas várias e incontáveis cadeias de relacionamento humano, comercial ou empresarial.
Sob o império do direito, e este é o nosso foco de observação, a submissão das partes à avença (pacta sunt servanda = os pactos devem ser cumpridos) está agora sob a incidência de seu contraponto prático e acadêmico (rebus sic stantibus = estando assim as coisas).
O artigo 393 do Código Civil brasileiro cuida das hipóteses de força maior e caso fortuito para informar que o devedor não responde pelos prejuízos (deles) resultantes, exceto “se expressamente não se houver por eles responsabilizado.”
De toda sorte, não será por falta de amparo legal que os vitimados pelos efeitos da pandemia estarão à míngua e sem proteção.
Seja um ou outro o motivo (legal e teleológico) para justificar o descumprimento de determinada obrigação, com o propósito imediato de escusar o devedor pela falta, exonerando-o de penalidades, multas e do dever de indenizar, encontramo-nos às portas de um período complexo e delicado de apuração, contabilização, alocação ou divisão de prejuízos (onde e como couber) – em sede de renegociações, ancoradas no princípio da boa-fé objetiva, em amplo espectro, a fim de (I) mitigar ou evitar perdas efetivas, (II) quando possível, preservar o vínculo jurídico-obrigacional, ou (III) cuidar de sua terminação, do modo menos traumático.
E, mais importante que tudo isso, desde agora e especialmente no pós-pandemia, já é tempo para se pensar no saneamento dos relacionamentos pessoais, comerciais e empresariais visando a reconstrução e/ou à consolidação de vínculos contratuais.
Por óbvio, à vista da inexistência de nexo causal bem demonstrado, não será possível, nem razoável, invocar a pandemia para se furtar ao cumprimento de obrigação. Ou seja, a incapacidade de adimplemento, dos pontos de vista subjetivo e objetivo, somente poderá ser alegada se a mesma for, ao menos indiretamente, decorrente dos efeitos do surto epidêmico do COVID-19.
Dada as ordens de grandeza, as dissensões e disputas porventura nascidas da inexecução das obrigações (na esteira dos parágrafos precedentes) poderão provocar uma crise no sistema judiciário brasileiro – senão crise aguda, uma piora importante na sobrecarregada e deficitária máquina de prestação jurisdicional.
Conciliação, mediação e arbitragem
Daí, a importância do uso de meios adequados para resolução de disputas, como a CONCILIAÇÃO, MEDIAÇÃO e a ARBITRAGEM – como alternativas ao emprego dos serviços estatais do Poder Judiciário.
E não apenas os procedimentos institucionais administrados pelas CÂMARAS PRIVADAS ou CENTROS DE ARBITRAGEM E MEDIAÇÃO, cada vez mais conhecidas e prestigiadas, mas também os AD HOC, em que as partes procuram diretamente profissionais neutros e imparciais, capacitados a proferirem uma DECISÃO ARBITRAL, célere, segura, precisa e isenta de infindáveis questionamentos ou a CRIAREM CONDIÇÕES PARA QUE AS PARTES SE RESOLVAM.
Esses procedimentos AD HOC podem ocorrer no recôndito de escritórios de advocacia, longe da burocracia dos tribunais, ou em quaisquer outros ambientes profissionais de mediação e arbitragem, desde que baseados na autonomia das vontades e manejados por profissionais hábeis e sensíveis aos temas atinentes à órbita dos contratos, conscientes da importância dos ganhos difluentes da composição racional – e extrajudicial – de conflitos.
Contratos
O momento é excepcional para a revisão de vínculos contratuais em geral, com outras recomendações específicas, dentre elas o armazenamento cuidadoso de documentos, dados, informações, correspondências em geral, a notificação e o aviso acerca da impossibilidade real e concreta de adimplir, para o fim de fazer prova de causa e efeito nas situações em que o direito se preste a tutelar.
Por fim, e não menos importante, novos contratos e transações empresariais (sim, a roda não para, mas apenas gira mais devagar) devem dispor sobre os efeitos do prolongamento da pandemia, no que toca a capacidade de entrega/execução de cada contratante, mitigação de perdas e da alocação de riscos, formas e modos de resolução de controvérsias.
Proposta cria renda permanente de R$ 600 para pessoas em situação de vulnerabilidade
Seriam unificados quatro programas: o de Erradicação do Trabalho Infantil, o Seguro Defeso, o Bolsa Família e o Bolsa Verde.
O Projeto de Lei 3023/20 cria o Programa Renda Básica Brasileira, destinado a ações de transferências pecuniárias da União. O objetivo é tornar permanente o auxílio de R$ 600 mensais criado para mitigar os efeitos da pandemia de coronavírus (Lei 13.982/20). O Congresso Nacional reconheceu o estado de calamidade pública devido à Covid-19.
Conforme o texto em tramitação na Câmara dos Deputados, serão unificados quatro programas, o de Erradicação do Trabalho Infantil (Lei 8.742/93), o Seguro Defeso (Lei 10.779/03), o Bolsa Família (Lei 10.836/04) e o Bolsa Verde (Lei 12.512/11). O valor do benefício mensal será corrigido conforme a variação da inflação anual (INPC).
“É a possibilidade de que o povo tenha condições de atender às suas necessidades básicas de sobrevivência quando não estiver empregado”, afirmou o autor da proposta, deputado Eduardo da Fonte (PP-PE). Conforme o projeto, os atuais beneficiários dos programas unificados serão automaticamente incorporados na nova ação governamental.
Regras gerais
Para ter direito ao benefício, será exigido do requerente: pelo menos 18 anos, salvo se mãe adolescente; não ser titular de outro benefício (previdenciário, assistencial, de transferência de renda ou seguro-desemprego); renda familiar mensal per capita de até 1/2 salário mínimo, ou mensal total de até três mínimos; e não ter recebido no ano anterior acima do limite de isenção do Imposto de Renda das Pessoas Físicas (IRPF).
A pessoa não poderá ter emprego formal (CLT, Decreto-Lei 5.452/43) ou vínculo como agente público. O texto prevê exceções nos casos de microempreendedor individual (MEI); contribuinte individual ou facultativo do Regime Geral de Previdência Social (Lei 8.212/91); trabalhador informal (empregado, autônomo ou desempregado, inclusive intermitente inativo) inscrito no CadÚnico; e pescador artesanal.
A quantidade de beneficiários da renda básica em uma mesma família será limitada a dois membros, e a mulher provedora de família monoparental receberá duas cotas (R$ 1.200). As condições de renda familiar mensal per capita e total serão verificadas por meio do Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal (CadÚnico) e por meio de autodeclaração em plataforma digital para os não inscritos.
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A proposta insere no Código Penal (Decreto-Lei 2.848/40) o crime de recebimento irregular de benefício de programa governamental, com pena de prisão (de 2 a 5 anos) e multa. Constatada a irregularidade, inclusive por meio dos órgãos de fiscalização e controle, o responsável ficará inabilitado por cinco anos para iniciativas governamentais.
Financiamento
O PL 3023/20 determina ainda diferentes fontes para o financiamento do Programa Renda Básica Brasileira. Aumenta a alíquota da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) das instituições financeiras de 20% para 25%. Estabelece também a cobrança de Imposto de Renda sobre lucros e dividendos, e eleva de 15% para 20% a alíquota desse mesmo tributo sobre juros do capital próprio.
O texto cria uma nova contribuição com a mudança da destinação do Fundo para o Desenvolvimento Tecnológico das Telecomunicações (Funttel), mantendo as atuais alíquotas – esse fundo setorial acumula atualmente quase R$ 2,1 bilhões em saldo retido no Tesouro Nacional. Além disso, prevê que o governo utilize no programa o superávit financeiro do Tesouro apurado em balanço dos exercícios anteriores.
“O Programa Renda Básica Brasileira será uma grande oportunidade de patrocinarmos um grande avanço social, propiciará as condições de fortalecer o mercado interno por meio do consumo das famílias e estimulará o progresso econômico”, disse Eduardo da Fonte. Outra proposta dele prorroga o auxílio de R$ 600 até dezembro (PL 2550/20).
Outras iniciativas
O auxílio emergencial de R$ 600 é a principal medida, em volume financeiro, para mitigar os efeitos econômicos da pandemia de coronavírus. Foram liberados R$ 152,6 bilhões. Quase 80 iniciativas parlamentares na Câmara dos Deputados buscam ampliar o rol de potenciais beneficiários ou estender o prazo dos pagamentos (hoje, três parcelas).
Eduardo da Fonte lembrou ainda que a Lei Suplicy (Lei 10.835/04) instituiu a renda básica de cidadania, mas “infelizmente nunca [foi] totalmente implantada”. Essa norma prevê que brasileiros residentes e estrangeiros há pelo menos cinco anos no País receberão do governo um benefício monetário anual, não importando a situação socioeconômica.
Projeto institui medidas para abrigar mulheres em situação de violência durante a pandemia
Texto dispensa boletim de ocorrência para acolhimento de mulheres em abrigos e prevê que hotéis e pousadas possam ser requisitados como abrigos temporários, mediante indenização do Poder Público.
O Projeto de Lei 1552/20 institui ações para o abrigamento de mulheres em situação de violência doméstica enquanto durarem as medidas de isolamento social para evitar a contaminação pelo novo coronavírus.
Em análise na Câmara dos Deputados, o texto é assinado pela deputada Sâmia Bomfim (Psol-SP) e mais 22 deputados de diferentes partidos. A coordenadora da bancada feminina, deputada Professora Dorinha Seabra Rezende (DEM-TO), pediu urgência para a matéria.
Pela proposta, os serviços de abrigamento serão considerados essenciais – ou seja, não poderão ser suspensos durante a pandemia de Covid-19.
O texto assegura às mulheres em situação de violência o acolhimento em abrigo sigiloso temporário por 15 dias, acompanhadas ou não de seus filhos, antes do encaminhamento para o abrigamento provisório final, quando este for necessário (casos de grave ameaça ou risco de morte). Caso não existam vagas em abrigos sigilosos, poderão ser requisitados pelo Poder Público pousadas e hotéis, mediante indenização posterior. O sigilo e segurança da mulher abrigada deverão ser resguardados nesses locais.
“A medida busca não somente atender às recomendações de contenção do Covid-19 como também não expor ao contágio mulheres e crianças que já seguem acolhidas nos locais de abrigamento, evitando assim a propagação do vírus no sistema”, afirmam os autores da proposta. O texto também garante o transporte da mulher para os locais de abrigo.
Dispensa de boletim
O projeto prevê que a inclusão de mulheres em situação de violência em programa de abrigamento poderá ocorrer a partir de requerimento a órgãos e instituições que compõem a rede de enfrentamento à violência contra mulheres, independentemente de registro de boletim de ocorrência (BO) ou deferimento de medida protetiva.
Em conjunto com esses órgãos, os municípios, por meio de suas secretarias de assistência social, deverão organizar o fluxo de atendimento e acolhimento das mulheres em situação de violência e a abertura de novos locais de abrigamento provisório e emergencial. Além disso, os municípios deverão disponibilizar um número telefônico para informações sobre vagas em locais de abrigamento emergencial, que deverá ser afixado em local visível em todo serviço público essencial em funcionamento.
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Cada estado deverá manter cadastro atualizado dos locais de abrigamento existentes nos municípios e estabelecer articulação com os demais estados para encaminhar mulheres que necessitem de abrigo em localidade distante de sua região de origem.
“Dada a ausência de um sistema nacional que padronize ações e procedimentos nessa seara, a proposta estabelece ações articuladas entre as diversas esferas para a garantia de fluxo e facilitação de acesso aos serviços”, explicam os autores.
Despesas
Pela proposta, o Poder Público não reduzirá o efetivo de trabalhadores e servidores nos serviços do Sistema Único de Assistência Social (Suas), e assegurará, mesmo que temporariamente, a contratação de profissionais dedicados ao atendimento às mulheres em situação de violência, como psicólogas, assistentes sociais, advogadas e cuidadoras de crianças.
As despesas para garantir a aplicação da lei, se aprovada, ficarão por conta da União, por meio da abertura de créditos extraordinários aos estados e municípios.
Proposta já aprovada
A Câmara dos Deputados já aprovou outro projeto que evita interrupção de serviços de combate à violência doméstica (PL 129/20). Pela proposta, os órgãos de segurança deverão criar canais gratuitos de comunicação para atendimento virtual de situações que envolvam violência contra a mulher. O atendimento presencial será obrigatório para os casos mais graves.
Atualmente em análise no Senado, a proposta permite que a vítima solicite quaisquer medidas protetivas de urgência por meios dos dispositivos de comunicação de atendimento online.
Gravação de conversa será usada como prova em ação contra construtora
A Quarta Turma do Tribunal Superior do Trabalho rejeitou o recurso da Quartz Construções e Materiais Ltda., de Brasília (DF), contra a condenação ao pagamento de R$ 5 mil de indenização por danos morais a um assessor de gerência. O empregado apresentou na Justiça gravação de uma conversa em que foi acusado de furto pela gerente, mas a empresa alegava que prova era ilegal.
Furto
Segundo o processo, o assessor foi acusado pela própria gerente, em ligação gravada pela advogada, de furtar a empresa. Em um dos trechos, a interlocutora teria afirmado que ele “estava roubando há um tempão”, com o objetivo de fazer com que a advogada desistisse do caso, na sua avaliação. Ele, então, anexou cópia da gravação à reclamação trabalhista e pediu a condenação da construtora ao pagamento de R$ 100 mil por danos morais.
Inconstitucional
Em defesa, a empresa alegou que o fato ocorrido não seria suficiente para ofender a dignidade do empregado. Sustentou também que a conversa entre a gerente e a advogada ocorrera “fora de ambiente passível de constrangimento”. Na avaliação da Quartz, a gravação não poderia ser utilizada para condená-la, pois a lei autoriza a interceptação telefônica apenas mediante autorização judicial.
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Gravação
A 4ª Vara do Trabalho de Taguatinga (DF) negou o pedido de indenização por falta de provas, mas a sentença foi reformada pelo Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região (DF/TO), que entendeu que a prova referente à gravação era lícita. Segundo o TRT, o empregado fora submetido a constrangimento, e a empregadora havia quebrado a confiança contratual, ocasionando “dano ao patrimônio moral do trabalhador”.
Prova lícita
Para o ministro Alexandre Ramos, relator do recurso de revista da empresa, não houve ofensa à lei no reconhecimento da gravação como prova. Segundo ele, é lícita a gravação de conversa por um dos interlocutores, ainda que sem a ciência do outro participante, assim como a gravação feita por terceiro com a autorização de um dos interlocutores sem o conhecimento do outro, desde que não haja causa legal de sigilo ou de reserva da conversação.
A decisão foi unânime.
Processo: 281-72.2016.5.10.0104